Vivendo num lugar multicultural

Esta semana entreguei uma redação para uma das minhas aulas de inglês sobre como educar crianças em um ambiente multicultural. A professora ficou admirada com o meu trabalho, porém mais ainda quando eu disse que não tinha filhos. Como é que alguém que não tem filhos escreve sobre criação dos mesmos num lugar multicultural. Porque um dia eu os terei, ora bolas e desde já, quando eles não estão nem nos planos tento me educar sobre o assunto, porque sei que os desafios serão imensos.
Que os Estados Unidos é uma mistureba de culturas todos sabem, mesmo que não pareça. Só que alguns lugares são mais multiculturais dos que os outros. Principalmente nas duas costas, de forma acentuada nas regiões de San Francisco e New York pessoas das mais diversas culturas e origens dividem o mesmo espaço.
Isto é bom? Na maior parte do tempo eu digo que sim, mas claro que nem tudo são flores.
Em primeiro lugar quando você convive com pessoas diferentes, que pensam, acreditam e vivem de forma diferente de você, automaticamente e indiretamente os seus próprios valores e conceitos são confrontados. Lembro que quando mudei-me para os Estados Unidos, comecei a analisar e questionar a forma como os americanos vivem e como eu vivia. Aprendi muita coisa, muita coisa deixei de lado porque não é para mim, não combina com os meus valores e estilo de vida. É natural, é saudável. Viver dentro do casulo e dizer que nunca muda, nunca mudará e sempre será assim não é melhor atitude, já que independente de onde moramos, o que fazemos e como vivemos, estamos em constante mudança.
Como disse acima, gosto muito de morar num lugar multicultural. Apesar de ter muitos brasileiros na minha região, eu não faço parte da panelinha. Não é atitude esnobe, ou rebelião,  nada disso. Talvez falta de oportunidade, talvez desinteresse. Não converso com pessoas e tento fazer amizades por causa de nacionalidae, mas por afinidade. E muitos dos brasileiros que encontrei por aqui nasceram no mesmo país do que eu, e esta era a única coisa que tínhamos em comum.
E quanta coisa eu já aprendi por aqui por não conviver com pessoas apenas da minha nacionalidade, por ter curiosidade e conversar com pessoas diferentes, de lugares diferentes. Fico fascinada como uma pessoa é um mundo inteiro a ser descoberto e fico maravilhada principalmente que apesar de não termos o mesmo idioma e não dividirmos a mesma crença e costumes algumas vezes, somos em essência o mesmo e buscamos o mesmo.
Aprendo demais com meus colegas de faculdade, mesmo aqueles chatos que nunca concordam com nada. Cada um tem uma história, um ensinamento e eu estou sempre pronta para aprender com eles. Tento também ser uma boa referência como brasileira. Dizer a verdade sobre o nosso povo e sobre o nosso país, sem exageros, sem muitas críticas. Já tive que rodar a baiana algumas vezes quando algum desinformado vem com aquelas idéias pré-concebidas sobre nós, como a velha idéia de que somos índios e vivemos na selva. Lembro que uma vez os meus colegas asiáticos ficaram de boca aberta quando mostrei o Brasil no mapa. "Nossa, não sabia que o seu país era tão grande!". A gente sempre aprende algo novo, basta estar aberto para isto.
E foi assim que eu também aprendi a experimentar comidas diferentes antes de entortar a boca e dizer "ECAAA". E com a facilidade de encontrar comidas autênticas por aqui, já que há uma variedade imensa de nacionalidades na Bay Area, sou abençoada com a opotunidade de fazer a volta ao mundo em restaurantes pelas redondezas. Antigamente eu comia muita comida tailandesa e mexicana. Agora aprendi a comer comida indiana, grega. Já experimentei um pouco de chinesa, coreana. Eu experimento de tudo, quer dizer, quase tudo. De vez em quando dá uma vontade maluca de comer comida brasileira, mas não sinto aquela vontade de comer arroz e feijão todos os dias. Acho que nem conseguiria me adaptar a esta rotina novamente. As vezes descrevo as comidas para amigos e família do Brasil e eles soltam o famoso "ECAAAAA" sem nunca terem experimentado. Acho que recebi o espírito de aventureira da minha mãe, que quando me visitou experimentou absolutamente tudo. E além da brasileira, claro... comida italiana sempre!
Outra coisa que sou apaixonada são as línguas. Algumas mais do que as outras, mas se eu pudesse, viveria estudando idiomas. Fiz uma classe de espanhol e outra de francês e fiquei apaixonada. Quem sabe quando tiver mais tempo.... mas acho engraçado que aqui é tão comum entrar no ônibus e ter instruções escritas em inglês, espanhol, vietnamise e chinês. Alguns lugares tem coreano também. Algumas pessoas não gostam desta mistura de idiomas, acham que somente o inglês deveria ser usado em todos os lugares. É um assunto super polêmico, do qual eu não tenho uma opinião completamente formada.
Alguns colegas dizem que é muito chato morar aqui. Principalmente os chineses, coreanos e vietnamises. Porque estas comunidades são grandes na região, então eles podem falar a língua deles o tempo inteiro, encontram pessoas da mesma nacionalidade em todos os lugares. Pra eles, é como se não tivessem saído do países dele, o que perde o sentido de viver uma nova cultura.
Entendo a situação deles. Quando morava em New Jersey, tinha uma cidade com uma comunidade brasileira muito grande e eu me sentia no Brasil. É muito estranho mesmo.
Ao mesmo tempo que é tão bom viver nesta mistura, as vezes é um lugar muito solitário também. As pessoas de cultura diferentes interagem de formas diferentes e pode ser um impedimento para se fazer amizades. É muito mais complicado do que se parece. Palavra de quem vive na pele esta situação. E acho que estas é uma das razões pelas quais você vai perceber que geralmente o pessoal da mesma nacionalidade criam grupinhos. Aí se você é diferente fica de fora...
Uma coisa que detesto é o preconceito que ainda existe, principalmente de alguns americanos cabeça fechada. Gente, o país foi criado e desenvolvido por imigrantes! Que eu saiba os americanos não são descendentes diretos dos "Native Americans", certo? Eles são descendentes dos europeus, asiáticos, africanos, blábláblá... então porque que ter preconceito com os imigrantes? Nem vou entrar na questão de imigração e de empregos, mas de aceitar pessoas ao redor que continuam cultivando sua própria cultura e língua. Nem todo mundo que vem para os Estados Unidos se tornarão americanos. Americanizados pode até ser, pois o ambiente onde vivemos tem uma grande influência nas nossas vidas, quer gostemos ou não.
Pros meus amigos do Brasil, eu estou americanizada. Pra mim, estou aberta a novas culturas, novos conhecimentos. Aprendi a pensar "outside de box", saí da minha bolha onde morava. A gente não sabe que vive numa bolha até quando temos a oportunidade de sairmos dela. Só assim me dei conta de quem eu era, o que pensava, como vivia, no que acreditava.  Não sou melhor do que ninguém, como não acredito que ninguém é melhor do que eu, só porque tem vários carimbos no passaporte. Não adianta viajar e apenas visitar os lugares, olhar as coisas da mesma forma. É preciso aprender a respeitar acima de tudo, o indivíduo e saber que nem ele e nem você é melhor do que o outro, ou mais inteligente ou mais bonito ou mais nada. Somos todos iguais e ponto final, quer você goste ou não. E nem precisa sair do país para sair da bolha. Mudar de cidade, de bairro, de estado e você vai ver a diferença.

6 comments:

  1. Adorei o post. Também acho bem engraçado (no sentido "que estranho," não no sentido "hahaha") como os americanos do interior as vezes são bem conservadores no quesito imigrante. E acho bastante interessante (e as vezes, um pouco "close minded") como as comunidades de imigrantes realmente se unem e parece que você nem saiu do país de origem. O conceito de Chinatown, Little Italy, Little India, etc é bem curioso para mim...Honestamente, não vejo a graça de se despencar para um outro país e ir morar no "little Brazil"...até entendo que tem gente que não tem a opção (se você é refugiado, etc, até entendo querer conviver com pessoas da mesma cultura) mas quando a escolha é sua, acho que o legal é mesmo conviver com cultura difernete para aprender um pouco mais sobre o mundo (e sobre si mesmo, né?)
    Não sei se você conhece essa expressão, mas muita gente se refere aos EUA como o "melting pot" de culturas/raças/etc...e recentemente, cientistas políticos começaram a argumentar que aqui não é um "melting pot" mas sim uma "tossed salad" (ou seja, todo mundo junto, mas no fundo, poucos realmente se misturam com os outros...)
    Beijinhos e bom domingo!

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  2. gostei mto do seu post Paulistana mas confesso q ñ gosto mto de mta mistureba num só lugar. Meu marido é canadense e eu detestava as "panelinhas" dos imigrantes pq p/ mim imigração só é válida qdo há interação. Não acho certo usufruir de um país só p/ ganhar dinheiro p/ mandar p/ o país de origem ou ficar juntando pra poder voltar p/ o país de origem. O Canada é um país limpinho e qual não foi meu espanto qdo fui conhecer certos bairros em Toronto (ñ preciso citar raças) e me sentir em outro país, tal a sujeira e descaso pelo país onde essas pessoas viviam e faziam questão de se sentir "em casa". Tb já dá pra sentir q a imigração desenfreada está surtindo seus efeitos negativos inclusive aumentando e mto a criminalidade infelizmente. Já acompanhei alguns blogs de brasileiros morando no Canada mas desisti pois eles quase q só falam mal do país q os está alimentando. Pelo menos os brasileiros q vivem nos EUA (na sua maioria) elogiam o país e interagem, evitando as terríveis "panelinhas", c/ exceção dos arredores de NY onde bairros inteiros de brasileiros são comuns e nunca entendi pessoas q chegaram a viver lá por 10,15 anos e voltam sem falar uma palavra em inglês...

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  3. Helen,
    Eu já ouvi a expressão melting pot sim, estudei na faculdade trimestre passado, e realmente não é melhor maneira de descrever a mistura de culturas daqui.
    Judy, também não gosto de ler sobre pessoas que moram aqui e só reclamam do país. Infelizmente a maioria destas pessoas não podem aproveitar a vida aqui 100% por estarem ilegais também... conheci uma brasileira que morava aqui há 8 anos e mal falava Thank you. Velha situação de morar com brasileiros, trabalhar com brasileiros e viver com eles.

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  4. Paulistana, adorei o post!! Acho muito estranho esta postura tao fechada com relacao a imigrantes de alguns americanos, pq afinal, o pais foi formado por imigrantes ne? Eu gosto de poder ter contato com a diversidade cultural, acho bem positivo, mas nao acho muito bacana qndo as pessoas de um pais so se envolvem com pessoas do mesmo pais. Uma tristeza, pq uma grande oportunidade foi exposta para esta pessoa, e ela acaba desperdicando!! E este e' um efeito que vejo muito por aqui, as pessoas vem fechada para o novo pais que escolheram, e decidem viver no mesmo ritmo que viviam no pais Natal. Vai entender!!! bjuss

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  5. Eu também gosto de ter contato com outras culturas, apesar de muitas vezes não entender certas atitudes e é mais difícil desenvolver relacionamentos mais duradouros.

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  6. Sou paulista do interior, moro na California tambem e na minha visao, esse pais como um todo e apenas uma maquina ou um tipo de desculturacao de pessoas para o nada, por que nao existe cultura definitiva ou formada nesse pais. Leia esse exemplo: Sou de uma regiao em que houve uma imigracao grande no passado de italianos, alemaes, japoneses, sirios libaneses, portugueses, etc e migracao de nordestinos de varios Estados do Nordeste, e negros libertos da escravidao com indios pacificos onde nao ofereceram nenhuma resistencia ao homem branco, incrivel como se interagiram, casaram-se entre si,trabalharam juntos, desbravaram terras e desenvolveram o Estado mais rico do Brasil misturaram em apenas uma geracao, no maximo na segunda nao houve conflitos, nem segregacao, nem grupos fechados, nem bairros, nada disso, meus pais moravam em uma fazenda em que tinha uma grande colonia onde tinha familia de todos os lugares(japoneses, portugueses, italianos, nordestinos, ex-escravos,...) e viviam em perfeita harmonia e interacao, respeitavam valores de cada um e assim formaram-se cidades, povoados e locais onde o brasileiro nada mais e que a mistura de varios imigrantes, migrantes, ex escravos e nativos. Agora voce chega aqui e ve a forca como que o americano faz para se distinguir do imigrante e como ate os ex-escravos sao tachados afro-americanos, eles relutam em abrir para humanizacao e querem de todas as formas colocar o poder e a potencia acima de tudo, muitos brasilerios vem para ca e seguem esse caminho tambem, perdem valores e um resticio de cultura e acabam se achando melhores por isso, talvez por o proprio americano em si se achar melhor que todo o mundo e querer impor. A facilidade de comunicacao do brasileiro nunca obrigou imigrantes que foram para la a se formarem em faculdades para tentar se comunicar, ou melhorar o vocabulario, aqui voce estuda anos e anos e mesmo falando um bom ingles o teu vizinho nao fala Good Morning para voce. Voce aprende para voce e nao para compartilhar e sim para sobreviver e nao conviver.Essa e minha impressao.

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