6 anos de Califórnia...

13 de fevereiro de 2008.
Depois de um vôo perdido, uma viagem cansativa, coração cheio de medos, dúvidas, saudades. Avisto água, água, água e o avião vai baixando e eu não vejo sinal do aeroporto. Aparece uma ponte enoooorme no meio da água - a San Mateo Bridge - e eu fico me perguntando cadê o aeroporto, meu Deus???
O avião fica mais baixo e o meu coração acelera mais até finalmente ver a pontinha da pista e o avião tocar no chão. Era uma tarde linda, céu azul sem nuvens, um tempinho até gostoso pra quem tinha acabado de sair de uma nevasca na outra costa. E o capitão disse: "Welcome to San Francisco" e o meu coração pulou de alegria e medo. "Estou na Califórnia, meu Deus do céu! Não acredito!!". Era muito surreal.  Dali a alguns minutos estaria atravessando a Golden Gate Bridge para ir pra minha casa temporária. A emoção foi enorme, aquele cartão postal que via em fotos e filmes estava ali, diante de mim com o seu majestoso vermelho-ferrugem contrastando com as montanhas verdes e o céu azul. A sensação de atravessar aquela ponte pra mim nunca mudou. Ela faz parte da história da minha vida. Mal sabia eu que o meu primeiro date, com o amor da minha vida e agora meu marido seria ali. Mal sabia eu que iria passear por lá para esquecer problemas, para levar amigos que visitam e que seria pano de fundo da foto mais linda do dia do meu casamento.
Desde aquele dia tanta coisa mudou na minha vida, é até difícil colocar em palavras o que a Califórnia significa pra mim. Tem dias que a odeio, tem dias que penso que jamais irei sair daqui.
Só sei que depois de 6 anos neste lugar, o coração não palpita mais quando vejo as águas antes do avião aterrisar chegando em San Francisco ou os prédios agora já tão familiares chegando em San Jose.
E quando escuto o capitão dizer "Welcome to San Francisco" ou "Welcome to San Jose". O meu coração fica feliz e sente paz porque sei que cheguei em casa. Meu lar, doce lar.

Primeira travessia na Golden Gate Bridge

No nosso casamento...

Um dia de cada vez.

É exatamente assim que tenho vivido desde o dia 13 de janeiro.
Como havia comentado no post anterior, fui internada  e fiquei no hospital por 1 semana porque os meus rins estavam parando de funcionar, e porque eles não estavam fazendo a limpeza devida o meu corpo estava praticamente sendo envenenada colocando-me em risco de problemas no coração.
E tudo isto aconteceu por causa de uma doença do sistema imunológico chamada Lupus. Eu já tinha ouvido falar da doença, mas tudo o que eu sabia era que a pessoa que tinha tomava cortisol pra controlar e precisava ficar longe do Sol. Lupus é muito mais sério do que isto.
Pra resumir a história: o sistema imunológico dá um piriri e começa a atacar outros órgãos e tecidos do próprio corpo como sendo corpos "estranhos". No meu caso, a Lupus atacou os rins provocando toda a confusão descrita acima.
Do susto inicial - médico falando em hemodiálise, transplante de rins, quimioterapia. As coisas estão bem melhores, mas o meu estado ainda é considerado sério já que os rins ainda estão se recuperando e estou tomando "lite quimio"em casa. Os medicamentos estão ajudando a colocar ordem na casa, mas será um processo que durará alguns meses para ficar recuperada. Alguns dias estou bem, disposta até esqueço que estou doente. Há dias que já acordo cansada e estes dias são os mais difíceis porque começa uma batalha muito grande na mente. Da mente estar a 220km/h e o corpo ir a 5km/h.
É literalmente viver um dia, um momento de cada vez. E fazer o melhor a cada dia e se alegrar com as pequenas alegrias e pequenas conquistas em rumo a recuperação.
Dou graças a Deus todos os dias pelo suporte e amor incondicional do meu marido e o carinho da minha família e de amigos distantes e dos poucos amigos que estão perto dando força tanto para mim quanto para ele. Também dou graças a Deus por toda equipe médica e enfermeiros que me atenderam e cuidaram de mim, e por ter a tranquilidade em saber que recebi o melhor atendimento e tratamento disponíveis.
Pode parecer loucura, mas agradeço à Ele também por ter acontecido assim, de repente, de forma "súbita" porque a Lupus é uma doença que se mascara em outras enfermidades e muitas vezes passam se anos sem ser diagnosticada. Agora que eu sei o diagnóstico, vi que meu corpo deu vários sinais que eu ou ignorei ou pensei que fossem outras coisas.
Dou graças a Deus porque não sinto dores e acima de tudo porque sinto uma paz profunda que sei que vem Dele dentro do meu coração.
Toda esta situação me fez enxergar a vida de uma forma diferente. Sou obrigada a ver a vida de uma forma diferente. Acho que isto acontece com todo mundo que se dá conta do quanto a vida é frágil.  A visão do mundo, das prioridades, das pessoas, dos problemas, de si mesmo muda. E depende de cada um escolher qual será esta nova visão.
Poderia estar com raiva de tudo e de todos, querendo entender o porque disto estar acontecendo comigo e ficar amargurada e triste. Mas isto iria me ajudar na minha recuperação? Iria ajudar as pessoas ao meu redor?
Então eu escolhi encarar isto como mais um desafio, mais uma tempestade a enfrentar e que me deixará mais forte, uma pessoa melhor. As pessoas estranham o meu otimismo, dizem que eu nem pareço doente, mas se eu ficar chorando não vai adiantar nada, certo? Confesso que a força não vem de mim, eu sou humana, tudo é muito confuso e tenho que aprender tanta coisa sobre a doença, sobre efeitos colaterais, sobre os medicamentos. Mas eu tenho Deus acima de tudo e Ele me dá forças todos os dias para me sustentar, me guiar, me dar paz e me dar sabedoria para na medida do possível tentar retomar aos poucos a minha "antiga rotina".

Obrigada àqueles que enviaram votos de melhoras no post anterior. Foram recebidos com muito carinho.

Para saber mais sobre Lupus:

www.lupus.org - em inglês
www.lupus.org.br em português.